terça-feira, 25 de maio de 2010

As pessoas

Costuma-se dizer que os verdadeiros pilares das instituições são as pessoas. Isto é, o que torna um lar, uma instituição e, em última análise, um país verdadeiramente grandioso está directamente relacionado com a valia das pessoas que lhes estão associadas. E é sobre a "grandiosidade" do País de Gales (e, por arrastamento, de toda a Grã-Bretanha) que vos quero escrever hoje: as pessoas.

Antes de mais, uma pergunta que ressalta de imediato a quem visita estas paragens: quem são na verdade os nativos, os Britânicos? Existe pelas ruas uma tal diversidade de etnias, idiomas, tribos, dialectos ... que se torna muito difícil saber quem são os nativos (acreditem, é mesmo complicado por vezes!). Só para terem uma ideia no meu Departamento existem no corpo docente 2 ou 3 professores britânicos e os outros, cerca de 20, estrangeiros, de todos os continentes! Então imaginem os alunos de Doutoramento... (a começar por mim, não é?)

Vou porém dedicar-me neste pequeno espaço apenas aos britânicos (sejam eles ingleses, galeses, escoceses e (norte-) irlandeses). Ao longo de muitos anos todos crescemos com um certo número de pré-concepções acerca do povo britânico. E ao longo deste meu "exílio" tenho vindo a constatar a veracidade (ou não veracidade!) de algumas delas. 

Um dos "clichés" mais habituais associados ao povo britânico é a pontualidade. Quanto a isso, nada a dizer, são de facto seres extremamente focados em que tudo aconteça na hora certa, na ordem certa. Os autocarros são um exemplo disto: muito raramente se atrasam e fazem mesmo quando necessário algumas "paragens" mais prolongadas apenas para se manterem no horário previsto em todas as paragens subsequentes (caso estejam adiantados, evidentemente).

Outra coisa que torna os britânicos famosos é o chá, ou melhor, a "hora do chá". Constatei que realmente há como que uma "religião" do chá... há chá seja ao inicio da manhã, a seguir ao almoço ou "à hora do chá" - tipicamente às 16 horas. Faltam é os "scones", pelo menos os tradicionais ingleses! Visto que aqui existe a chamada bolacha galesa que, no fundo, é o "scone" galês (mas não tem nada a ver!!). Ah, e claro, também tomam o "café" da praxe..."café" entre aspas, pois claro, pois ele é inenarravelmente mau! Graças a Deus trouxe Delta de Portugal! ;)





















A bolacha galesa tem pequenas porções de uvas-passas (ou "coríntios", como lhe quiserem chamar)

Existe também a ideia que os britânicos são, regra geral, muito bem educados e tem um charme e humor frescos, um certo politeness (talvez uma ideia proveniente de personagens como o 007 de Sean Connery). Pois aqui é que as coisas mudam um pouco de figura! A "regra geral" torna-se "excepção" e o bom humor anda dissimulado (em estado de embriaguez não conta!!).
Apesar dos motoristas de autocarro serem muito bem educadinhos ao saudarem e agradecerem o serviço aos passageiros, são simultaneamente capazes de não deixar entrar alguém que chegue um "cagagésimo" de segundo atrasado à paragem ou que queira entrar 2 metros após a paragem, caso o veículo já tenha retomado a marcha.
Um outro exemplo da forma de ser dos britânicos (isto quando estão sóbrios, reforço!!) é o facto de muito frequentemente ignorarem o "próximo": entra-se numa sala/gabinete e nem uma nem duas...não está lá ninguém! Para já não falar das duas ou três vezes que já me deixaram com a mão estendida...cultura ou má educação, fica ao vosso critério!

A (falta de) limpeza dos britânicos afinal não é hábito exclusivo dos que vemos todos os anos no Al(l)garve...é algo generalizado mesmo! Senão vejam: recolhas de lixo reciclável quinzenais (!) e de lixo para compostagem semanais não rimam decerto com limpeza...e aqui sim, é cultural mesmo! É também triste verificar o tão pouco cuidado e gosto que, pelo menos os habitantes de Cardiff, têm para com os espaços verdes e canteiros florais (maravilhosos!) à sua disposição! Enfim, Suíça há só uma mesmo!!

No geral, penso que a Grã-Bretanha podia ser muito "mais Grã-Bretanha". Mas ninguém é perfeito, não é?
 

segunda-feira, 17 de maio de 2010

O inglês ... e o "cymraeg"

Como muitos de vós sabem, no País de Gales não se fala exclusivamente o inglês.



















Placa bilingue em Cardiff: inglês e galês. (foto retirada de http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:CallaghanSquareSignCardiffCaerdydd200507_CopyrightKaihsuTai.jpg)

Nesta imagem podem ver que as indicações estão feitas em duas línguas: o inglês e o galês (não, não é "gaélico". Existem semelhanças, mas este último é falado na Escócia.). Vocês "acreditam" que é galês o que está escrito na placa, não é? Pois não parece haver (e não há mesmo!!) grande similitude com o nosso bem conhecido inglês.

O galês deriva do idioma dos antigos povos Célticos que ocuparam o território do País de Gales no século VI, tornando-se desta forma a mais antiga língua ainda activa do Reino Unido. O inglês surgiu noutra era e de uma origem totalmente diferente: os Anglo-Saxões. Estes vieram das actuais Alemanha e Escandinávia, "fundindo" ao longo de três séculos (desde o século VIII ao século XI) os seus idiomas primitivos naquilo que podemos chamar de "inglês original". Ou seja, para grandes diferenças na origem, grandes diferenças na fonia/morfologia.

O alfabeto "galês" tem 28 letras, ao contrário do alfabeto latino (que tem 23 letras) e existe acentuação, o que não existe no inglês. É também de notar a estrutura frásica, que é muito mais próxima da nossa, ao contrário do inglês onde existe a chamada "inversão do sujeito". Existem muitas outras diferenças que não interessa aqui mencionar (e das quais apenas sei pois investiguei um pouco, claro!).

Hoje em dia, o galês (cymraeg) é tão lingua ofícial do País de Gales como o é o inglês. E tem os mesmos direitos, institucionalmente. Daí aparecer em todas as placas indicativas, bem como em edifícios e nomes de ruas! (mesmo que o nome de algumas ruas em galês tenha sido inventado a partir da palavra inglesa correspondente!)

Mas desenganem-se se pensam que esta é uma língua residual/em desuso. Não é bem assim! Na verdade, 20% da população fala a língua e este numero tem vindo a crescer, pois existem cada vez mais escolas primárias que leccionam 100% em galês. Isto deve-se grandemente ao sentimento nacionalista da população (e, por consequência, anti-Coroa Real), que tem vindo a ganhar terreno desde meados do século XX - com o fim do império do carvão. Porém, não é vulgar ouvir falar galês em Cardiff, bem como nas outras grandes cidades de Gales (Swansea e Newport). Este crescimento têm-se verificado mais nas zonas rurais, no Norte e Oeste do país.

Como calculam, não "pesco" nada de galês, mas acho-lhe piada. E acima de tudo tenho muito respeito por este povo, que está a lutar por preservar uma raiz, em contra-ciclo com a tendência actual de "harmonização" cultural (eufemismo de globalização), que tem vindo a fazer desaparecer (quase) tudo o que é típico e regional. "Well done, welsh people"! Ou deverei dizer: "wneud yn dda, pobl Cymraeg!" ?
 

terça-feira, 4 de maio de 2010

A "comida"

Depois de uma pequena visita turística por Cardiff, aproveito agora o mote com que terminei a minha última mensagem e vou hoje falar-vos sobre a "comida" em Cardiff e, de um modo geral, no Reino Unido.

Começando pelo pequeno-almoço, sugiro-vos o tradicional pequeno-almoço galês: um belíssimo "pão" de algas (sim, algas!) acompanhado de ovos mexidos, berbigões fritos, bacon e salsichas! E claro, para acompanhar um pint (0,568 litros) de Brains, a cerveja "oficial" do País de Gales. Com fome já?? :)




















Pequeno-almoço tradicional do País de Gales (imagem retirada de www.welshfoodie.com/s_wales_dining.htm)

Então passemos agora aos pratos principais! Para além do "petisco" Jacket Potatoes que já vos apresentei na mensagem anterior, temos:






















A sopa tradicional galesa: cawl - com carne de cordeiro, legumes, queijo e pão... e mais nada! (imagem retirada de www.ukstudentlife.com/Travel/Tours/Wales/All.htm)

 














Peixe com batatas fritas (fish and chips), com ketchup (mas sem sal e com muita gordura!) (imagem retirada de my.opera.com/kirstycat/blog/breaded-fish-with-rosemary-oven-chips)






















Faggots (almôndegas) com puré de batata e ervilhas - mas sem condimentos nem salada de legumes... (imagem retirada de en.wikipedia.org/wiki/File:Faggots-and-gravy.jpg)



























A tradicional tarte dos pastores: Shepperd's Pie - dever-se-ia chamar "tarte dos pastores viúvos"...acreditem, já provei! (imagem retirada de www.bbcgoodfood.com/recipes/3208/quick-spiced-shepherds-pie)

Como podem ver, para além de uma gritante falta de bom gosto (e de amor à própria saúde, diga-se de passagem!!), falta certamente aos britânicos, e aos galeses em particular, uma "mãe" que cozinhe para eles!

Não existe uma tradição culinária consolidada no Reino Unido, o que torna as suas "confecções" (demasiado) primitivas. O uso de especiarias na confecção dos pratos é algo de aparentemente "exótico", sem interesse! Quando falo em especiarias, incluo aqui o sal...! E só para terem noção, o azeite aparece nos supermercados na secção "comida internacional"...

A esta "não cozinha" ajudam as "pancas" britânicas quanto às alergias alimentares (ao sal, à pimenta, ao gluten, ...). Assim, as pessoas que desejem sal/pimenta/... nos cozinhados que os coloquem à parte após o prato chegar à mesa! Quem de vós cozinha sabe bem que não é (nada!) a mesma coisa!!

De uma forma geral, para os britânicos "cozinhar" significa deitar os ingredientes numa panela com água, ligar o fogão e esperar que fique pronto...por fim juntar o "saudável" ketchup ou outros molhos pré-comprados e fazer a festa! Ah, existe também claro a alternativa de fritar! Tudo bem regado com uns belos pints! Mas, se querem mesmo saber, a alternativa preferida deles é ir ao fim da tarde a um dos inúmeros fast-food take-aways que existem por estas ruas e levarem para casa a "refeição" para toda a família...sim, mesmo para as crianças pequenas!

Contudo, existem por aqui alguns "céus" no meio deste "Inferno" culinário: pelo menos dois restaurantes portugueses, que eu conheça. Já fui a um deles e definitivamente é um achado por estas bandas! Existem também imensos restaurantes italianos, sendo que uma boa parte deles parece ter qualidade.

De qualquer forma, eu cá prefiro comer sempre no meu próprio "restaurante"! É também uma forma de me sentir mais próximo de quem deixei...ah, e a saúde e carteira agradecem!